2 de out. de 2010

AVALIAÇÃO VOLKSWAGEN SPACEFOX I-MOTION


A Peruazinha que sonha em ser Audi

Por Mister Fórmula Finesse

No início de 1994, os modelos da Audi começaram a ser trazidos ao Brasil pelo piloto Ayrton Senna, e desde os primeiros contatos, ficou patente o avançado nível de engenharia empregado nos carros, bem como sua disposição para enfrentar de igual para igual as outras marcas bávaras mais conhecidas como Mercedes e BMW. Claro que esse embate era menos conhecido por nós brasileiros, pois a marca Audi é desde antanhos conhecida pela excelência técnica; seja através dos carros que batiam recordes nos anos 30 com seus motores não raro atingindo seiscentos cavalos, ou com os míticos Quattro de ralis... a marca simplesmente cospe fogo e esbanja competência desde há muito tempo. Voltando a 1994, um dos predicados mais chamativos da marca era o famoso câmbio Tiptronic, uma opção sequencial que fugia do tradicional molde das opções automáticas até então, pois oferecia uma troca de marchas mais rápida – e consequentemente mais esportiva – do que simplesmente usar as caixas tradicionais do mesmo modo, ou seja, comutando a alavanca pelo caminho entre D e as outras opções. Um toque para o lado, e o motorista tinha um novo leque de aproveitamento da caixa, rápido, intuitivo e eficaz...essa era a Audi.


Em 2010, o expediente da caixa sequencial já se tornou quase um commodite, aplicado em versões bem mais baratas do que os carros pioneiros, e isso é ótimo, sintoma claro de evolução técnica e aceitação de mercado, a própria Audi e sua atual trocenta geração de caixa sequencial – com embreagem dupla – continua ali colhendo os frutos na incessante pesquisa para melhorar o sistema gerenciador.


Essa pequena introdução de alguns aspectos da Audi, se fez necessária para entender um pouco mais a quantas anda o produto da sua controladora em terras tupiniquins, a Volkswagen SpaceFox.

Dezenas de testes já foram escritas sobre o modelo, evocando seu claro amadurecimento e o conjunto bastante coerente para a utilização proposta. O que vamos sublinhar aqui, é a utilização com um toque a mais de entusiasmo.

A SpaceFox não é uma legítima sucessora do espírito irrequieto e jovem (de origem) da quase finada Parati, trata-se de um produto mais sisudo e utilitário, priorizando o espaço, a praticidade e aquela posição de dirigir tão em voga de “olhar tudo por cima”. Um carro que foi um dos primeiros dos nacionais a “verticalizar” ao invés de ganhar largura e comprimento para franquiar mais espaço.

Esse viés mais pragmático é ótimo para o transporte de volumes, mas dificilmente você verá uma opção como SpaceFox GLS, sigla que fazia a festa de quem gostava de carrinhos mais quentes na vertente pequena da linha VW à água... ah, os anos 80!

A "Space" ficou mais interessante mesmo em 2010, frente de acordo com a identidade global pretendida, associando desde Amarok até o novo Jetta que será lançado...todo o arco VW tendo feições que trazem identificação imediata; pena que esse DNA VW não se estende a linha de motores também, mas não dá para se ter tudo, infelizmente. O detalhe Audi aparece externamente nas lanternas traseiras, com a iluminação em leds, formando um efeito bastante bonito quando acesas. O conjunto lateral é coerente e por demais conhecido para produzir maiores comentário ou causar arrebatamentos...desenho estrutural bem feito desde o CAD; será passível apenas ao longo dos anos de pequenas plásticas, nada além disso.



Andando na pequena station


A versão avaliada foi uma top de linha com o comentado câmbio I-Motion, um parente mais simplório mas com os mesmos propósitos do famoso Tiptronic que fez muito da fama da Audi. O assento é naturalmente elevado e mesmo na posição mais baixa, aquela sensação de vestir o carro fica um tanto prejudicada. O painel melhorou em todos os sentidos, e aquela sensação de painel de protótipo futurista – e simplista – do modelo anterior agora faz parte de uma tola lembrança. O volante de direção, baseado no do Passat CC, deveria ser item obrigatório até das Kombis, simplesmente uma ferramenta muito táctil e deliciosa de controlar.

O motor é uma unidade bem civilizada, que produz baixas vibrações e é corretamente abafado pelo material que abafa ruídos. Tudo muito macio, bastante silencioso, familiar...é hora de rodar. O console que abriga o câmbio I-Motion é bastante intuitivo na hora de apresentar o motorista ao dispositivo. De cara, o condutor mais sanguíneo já vai procurar o modo manual para experimentar a novidade. Um toque para frente, em direção ao ícone com o sinal de mais, e o carro começa a se mover, o movimento da alavanca apresenta curso bastante curto o que prioriza movimentos controlados do braço; é como acariciar a cabeça de uma criança e não dirigir com movimentos expansivos e italianos com o braço direito....


As marchas se sucedem sempre para frente no console, em contínuo e linear avanço, e você percebe desde o início que a propalada “cabeçada” que o comando dá nas mudanças de marcha são coisa de jornalista com braço e pé pesado, basta aliviar um pouco o pé e com delicadeza mover a alvanca para frente, que o progresso de velocidade continua sem interrupções aparentes, tudo muito fluido como água descendo das montanhas. As reduções são feitas puxando a alavanca para trás e a entrada do motor é sempre feita com coerência e delicadeza... isso, claro, andando devagar.


Entendido o funcionamento do câmbio, chegou a hora de puxar mais forte de verdade e ver o quanto de desempenho foi mantido ou tirado através dessa opção. O pé começa a ficar mais pesado no acelerador, a ausência do pedal de embreagem deverá mitigar as pancadas sobre as homocinéticas nas trocas mais rápidas e tudo deverá funcionar como antes, apenas a ritmos mais acelerados pensa você....e é o que acontece! O motor enche rápido, e as trocas são feitas em toques decididos e ao mesmo tempo delicados, o trem de força ameaça duplicar os limites legais de velocidade da via – 80 km/h – antes de entrar a última relação da caixa, tudo isso feito com coerente naturalidade e constante transmissão do fluxo de potência. Na versão de caixa manual, você chegará um pouco antes a esse patamar se partir com o carro em movimento (depois explico as arrancadas), mas os trancos ao liberar a embreagem com o motor in extremis sempre se farão sentir bem mais.

As reduções são de sobremaneira fáceis de executar em velocidade, o motor é acelerado pela central no instante anterior a queda das marchas, como se fosse um punta-tacco, tornando toda a tocada mais profissional e suave. A estabilidade é correta e só se estiver disposto a abusar muito – e causar olhares feios dos outros – é que poderá roçar os limites. Não foi o caso, mas em um retorno vazio de rodovia, deu para vir descendo as marchas “lá de cima” até a segunda, em escala perfeita devido o curso único da alavanca, freando com convicção e entrando na rotatória com a marcha engatilhada, assinando com motor e borracha toda a extensão da manobra....quem disse que automático não risca asfalto?

Claro que foi devido mais a acomodação do peso na lateral do carro do que propriamente devido ao motor, mas impressão de potência sempre fará o entusiasta sorrir.


A lógica inversa do câmbio – defeitos


Para ficar perfeita, considero que deveriam inverter a ordem da caixa, com as reduções para frente e com o avanço para trás. Qualquer carro gera mais força G nas freadas – com exceção os de arrancada – do que nas acelerações. Nas saídas mais quentes, mesmo com um carro de pouca potência, a pressão nas costas é para trás, tudo é jogado em direção ao porta malas, e o mesmo deveria acontecer com a mão que comanda a alavanca. Freadas de emergência também, você pendura nos freios, olhos saltando das órbitas, e a mão direita mais rápida do que a do Steve Vai, cambiando para frente descendo todo o elenco de marchas. Faria mais sentido pelas ordens físicas impostas...


A arrancada é realmente a parte mais triste em performance, você gira o motor em primeira a toda e libera o freio com o pé esquerdo, é só acompanhar o crescimento das plantas ao redor, pois a aceleração é realmente lenta pois o carro sai sem ímpeto algum, e enquanto um eventual oponente na SpaceFox manual canta pneu da segunda para terceira marcha, você fica tratando dos bonzais e cambiando ao mesmo tempo. Eu queria tentar acelerar em neutro e jogar a primeira de uma vez, mas ali eu já estaria saindo do flerte com o carro e indo direto para o sadô....deixemos a violência para outra vez.


Conclusões:


Ótima opção entre as stations pequenas, boa de dirigir, com o DNA “pegador” da VW em termos de interatividade ao volante, ótima para trânsito urbano, a caixa sendo um primor de cilividade se utilizada com coordenação suave entre pé no acelerador e mão, e boa em estradas com curvas também. Mas, quando os verdadeiros espaços se abrem em largas e longas rodovias, é possível perceber que o motor leva bem até as primeiras três relações, e o motor VHT dali em diante começa a claudicar em velocidades mais elevadas ou retomadas mais fortes. Com lotação, o torque produzido não permitirá muitas brincadeiras e sem uma pedal de embreagem para cutucar a mansa fera embaixo do capô, as ultrapassagens irão precisar de um certo cuidado. Globalmente se perde sim um pouco de desempenho, mas a comodidade em centros urbanos é insuperável, a caixa é uma opção barata, mas gloriosa em relação aos Tiptronics de outrora, e o parentesco espiritual com os Audis – seja através da caixa, leds e detalhes do painel – é sempre um pequeno alento para quem quer investir nessa pequena, mas espaçosa, “perua”.

Não, ainda não é um Audi de entrada, mas com um motor um pouco mais parrudo ela ficaria incrível para os padrões nacionais.


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