Por Mister Fórmula Finesse
Não é de hoje que o segmento de carros médios e hatches anda pegando fogo. Como são um meio termo entre carros mais esportivos e sedã familiares – e afastam-se da massa dos populares - é normal que sua fatia de mercado tenha uma abrangência bastante ampla, conquistado do novato com devaneios de piloto até o cidadão mais pacato, que não precisa de tanto espaço no porta malas.
Por isso, tendo a memória ainda fresca de dirigir alguns dos mais representativos do setor, pensei em dividir com os leitores, algumas impressões de direção dos três carros do título; para esboçarmos um panorama do que o mercado oferece para quem gosta de dirigir um pouco mais forte.
É importante ressaltar que as condições não foram as mesmas para os três, com o Golf por exemplo, tive que comprimir 450 km em poucas horas e em rodovias que claramente inspiravam uma condução mais emocional. O Ford Focus por sua vez, percorreu meras dezenas de quilômetros em rodovia serpentina, o que de certo modo limita a fidelidade das impressões; e por fim... o Bravo foi analisado sob o ponto de vista de um test-drive um pouco mais “quente”.
Colocando todas as perspectivas em ordem então, podemos relativizar algumas coisas, e extrair sólidas impressões de outras. Vamos ver se conseguimos buscar o insight básico do que esperar de cada carro:
Carros analisados e quilometragem: Volks Golf Tech 1.6 VHT 2009 – 21.000 km
Ford Focus 1.6 Sigma 2010 – 8.000 km
Fiat Bravo 1.8 Torque 2011 - 350 km
Cabine: O quesito que mais chama a atenção primeiramente, afinal, o visual do carro é o que começa a agir sobre a alma do entusiasta. Nesse ponto, não existe muita discussão, o Golf parece algo saído do mais tenebroso inverno do Leste Europeu em comparação com o Focus e Bravo. Perfeita relíquia soviética, o pobre Volkswagen não têm mais nada a declarar nesse segmento, mesmo com as seguidas edições especiais que não trazem mais do que leve maquiagem a uma senhora que – aparentemente – está curtindo seu merecido crepúsculo.
O Ford Focus é uma pequena surpresa a cada vez que se olha ele, lanternas traseiras, linha de caráter da cintura, queda da parte final do teto, existe sempre algum aspecto que te chama a atenção positivamente cada vez que se coloca os olhos nele. Desenho sólido, fluido, para quem gosta de carros mesmo...os mais emotivos podem pensar na versão RS européia ou imaginar sempre estar conduzindo um perfeito WRC assim que sentam nesse carro. Um desenho tão bom, que continuará atual ainda por um bom tempo.
O Bravo, apesar de alguns chamarem de Puntão, tem a sua personalidade e carisma próprios; agressivo, com as lanternas traseiras um tanto Alfa e um tanto Ferrari Califórnia; ele clama para ser dirigido forte, a frente em cunha parece feita para cortar velocidade. Mas, o carro não veste bem cores mais “vendáveis” por assim dizer, ele some no prata padrão ou no cinza. As rodas na versão mais simples também não são nada inspiradoras...gostaria ver esse carro em uma versão amarelo Indianapólis como a do finado Stilo, “abriria” mais seu design quase arrogante.
Notas:
Focus 8 Bravo 8 Golf 4
Por dentro: Chumbo no Golf novamente; a versão Tech não tem vergonha em surrupiar o saldo de estoques do desaparecido Gof Gti; pedaleira e alavanca do câmbio são as mesmas. A antiguidade do carro aparece no rádio lá embaixo, longe das mãos, no imutável clúster que ano após ano muda algo em grafismo e no console central sem inspiração nenhuma para um carro desse preço. Mas justiça seja feita, o acabamento geral é de primeira qualidade, os plásticos parecem preenchidos de macia espuma, basta bater nos plásticos com os nós dos dedos para ter a impressão de “solidez macia”, de algo denso, bem feito e durável. Os arremates das costuras nos encostos de braço também são exemplares, assim como os bancos de um misto couro-tecido, interior datado...mas ainda bem feito.
O focus por sua vez, é mais arejado, amplo, com comando e acessórios visualmente mais modernos e agradáveis. Longe do perfeito volante e painel arrojado da geração anterior, o carro cativa pela impressão de ser feito para quem gosta de ficar várias horas ao volante. Mas...ao contrário do Golf, ele têm acabamento mais pobre; as borrachas dos comandos é de especificação muito macia, o que irá apagar os caracteres ali grafados. As laterais da porta são de uma pobreza franciscana, com plástico duro, quebradiço e oco. O tecido dos bancos é mais áspero e sombrio, parecendo herança do que a ford produz hoje em Camaçari, sem aquela padrão que fomos acostumados pela casa americana. Mas a sua ergonomia atual e melhorada em relação ao Golf, o habilita a combater o Volks que é representado aqui na sua versão top de linha.
O Bravo é a escola italiana, emotivamente, lembra os Puntos de Rally que militam na classe de dois litros, uma cabine razoavelmente espaçosa, mas preenchida por um sem números de dispositivos de segurança e desempenho...No Bravo, parece que bancos, painel, teto e demais instrumentos avançam sobre o motorista, como que para incentivar o prazer de conduzir. O painel têm – em seu teor – caracteres vintage, e a moldura dos mostradores é uma sinuosa peça de plástico macio e bem preenchido. Volante de ótima pega, verdadeiro imã para as mãos e uma alavanca de câmbio esperta com um ótimo pomo. Bancos envolventes e um padrão bastante bom de acabamento, algo bem “europeu”. É outro segmento em relação aos outros dois carros.
Notas:
Focus 7 Bravo 9 Golf 7 (salvo pelo bom acabamento)
Motor cidade/estrada:
Golf Tech 1.6: A potência declarada do Golf serviria para corar de vergonha até o mais empedernido fan da marca alemã. Mas as coisas não são bem assim quando a roleta está rodando; o motor de “apenas” oito válvulas é parrudo em baixa quase o suficiente para ligar e sair andando sem usar os pedais; exageros à parte, ele responde de forma consistente, não dando margens a hiatos de potência ou exagero na informação do pedal do acelerador. É ligar e soltar o carro sem qualquer drama ou falta de progressividade. Retoma certinho, sai das lombadas em terceira marcha sem tranquear sobre os coxins, uma beleza. Na estrada, ele continua mostrando caráter. Na viagem que fiz, sua velocidade – mesmo de noite – em uma boa estrada, ficou estabilizada nos 140 km/h , com o motor sempre parecendo engatilhado para angariar mais algumas dezenas de quilômetros-horários com decisão.
Mas, ele empurra com saúde atá ali, ultrapassa com vontade utilizando bem o câmbio, só que passando da barreira dos 140, a progressão começa a ficar bem mais lenta proporcionalmente, mesmo que de certa forma esperada. Para “tiros” realmente longos e mais velozes, como uma alegre viagem até Rivera, o motor 1600 cm3 começa a entregar o ouro, ficando um tanto áspero e gastador. Nesse ponto, o conjunto de suspensão assume o comando de vez nos fazendo lembrar que apesar de tudo, são apenas 104 cavalos para nos empurrar até o ápice. De todo modo, é um ótimo motor, mas não é interessante a Volks depender quase que unicamente dele para propelir sua linha nacional.
Nota: 7
Ford Focus: Surpresa! Eu esperava uma tartaruga reumática na cidade mas não é bem assim que acontece. Ele se locomove com bastante naturalidade nos espaços contidos e na topografia acidentada da cidade. Arranca firme no farol desde a faixa mais baixa de torque, se furta em partir em segunda das esquinas – quando não totalmente imobilizado – e gira suave e silencioso. Quando abrem as “janelas” à frente, seus 115 cavalos começam a parecer mais magros do que os do Golf, é preciso premir com vontade o acelerador; a cabine e a excelência do rodar, começam a disfarçar o esforço que o motor fatalmente será submetido nas rodovias. Ele perde o sentido quando começam as rodovias de pista dupla, pois seu peso de bigorna cobra o preço na hora de passar por carros teoricamente mais lentos. Falta mais vitaminas para fazer do Focus 1.6 uma ótima experiência rodoviária. Em comparação com o Golf, talvez apenas no limite final do contagiros ele seja um cabelo mais rápido, mas no mundo real – quando não precisamos pisar tudo o tempo todo – o Golf 1.6 VHT dá um baile em mobilidade e vivacidade.
Nota: 6
Fiat Bravo: Esse é o motor! Vivo, sorridente, vocal e sempre bem disposto. Esse propulsor simplesmente joga por terra qualquer tentativa de tomar a dianteira por parte dos seus dois rivais. Senti – um tanto preocupado – que se ele é bem disposto, cobra um pouco de disposição do motorista também. Ao arrancar com preguiça, nos limiares baixios do tacômetro, senti uma ameça de soluço do conjunto motriz, como se a protestar que parar tirar da inércia tantos quilos, é preciso de um pouco mais de decisão. Mas passado o nanosegundo de indecisão, o motor cresce como um balão enchido a gás, ele “abre”, gira com alegria, fala grosso e te atira com carro e tudo para os espaços que visualizou a instantes atrás com bastante galhardia. São 132 cavalos, substancialmente mais do que seus oponentes de cilindrada mais contida. A caixa de acionamento ultra leve ajuda a atiçar o propulsor. Com vergonha admito, fiz o motor entrar no corte de giros por duas vezes, tudo devido a ânsia de explorar cada polegada cúbica energizada a ar e álcool que o carro pode proporcionar. Com a direção na posição citadina, mais leve, parece um carro americano de volante muito leve e bastante disposição para comer distâncias. Ele pede, implorar para ser dirigido com vigor, eu imagino que miséria seria esse conjunto no corpo delgado de um Palio 2 portas 1.8R, seria algo para assustar criancinhas na calçada, pode apostar....mas esperem! Já existe uma versão da Strada com esse motor, imagino- a devorando Saveiros pelo caminho (talvez a antiga Tsi 2.0 seja mais indigesta). O motor 1.8 Gm, ao lado dessa pequena maravilha, parece algo mais adequado a um trator.
Nota: 8.5
Câmbio:
Golf Tech: rápido, preciso, fiel a toda a mitologia Golf. Mas, com o encosto dos bancos dianteiros abaixados, você erra uma passagem limpa para quinta marcha entre umas seis tentativas. Nada que o dono, carona e majoritário do encosto sinta; mas que você, motorista dedicado, sabe que a mudança não foi rápida e intuitiva como esperava. As reduções para quarta são um pouco mais duras com esse maledetto encosto abaixado.
Nota: 9
Focus Sigma: Alavanca bonita, bem acabada, mas decididamente um tanto pesada de manejar. Não desengrena com facilidade e o apoio entre os assentos dianteiros – na verdade uma espécie também de porta coisas – é fixa e atrapalha a movimentação do cotovelo. Se o motor não é muito disposto na estrada, a caixa não ajuda muito para colocar lenha na fogueira sendo mais lenta que dos seus pares.
Nota: 6,5
Bravo: câmbio de acionamento muito leve, pomo que aceita bem o contato da mão. Dá para atirar as marchas com vigor ou dirigir calmamente, em todas as situações, o dispositivo é bem agradável. Apenas percebe-se que os movimentos serão sempre mais expansivos do que ao operar a caixa Volks, um pouco mais, mas decisivo para quem gosta de extrair o sumo e é mais preciosista com a alavanca.
Nota: 8,5
Suspensão/curvas:
Golf: firme, correto, sólido e íntegro. Não assusta, mas empolga por poder “cozinhar” carros mais fortes respaldado apenas pela suspensão. Inclina pouco, não destraciona, aceita entrar firme até em curva de estacionamento de shopping. As rodas aro dezesseis jogam a favor do volante de direção, a inércia das mesmas, mais pesadas, ajudam a não permitir assistência hidráulica em demasia nas velocidades mais altas. Carro sempre na mão e tratável em calçamento menos apurado, um feudo Volks, tradição da linha Golf.
Nota: 9
Ford Focus: Também com a mesma habilidade do Golf em ler o piso, talvez até mais, mas a direção é um pouco leve se a condução não for verdadeiramente mais focada nas curvas. Estas, tomadas a talvez 80% da capacidade do carro, faz parecer um chão muito sólido mas de comando – volante – um pouco mais vago do que o ideal. Acredito que se apertar mais o carro, a direção fique mais atilada aos comandos das mãos. Questão apenas de ajuste fino, mas ainda assim, parece ser ótimo para estradas sinuosas.
Nota: 8,5
Bravo: Não foi possível exigir do carro nas curvas, que eram raras, mas a direção no modo mais firme e a suspensão apesar de filtrada parecem dar sinais de carro na mão...ainda a conferir!
Sem nota.
Conclusão:
Parece sintomático em relação ao gosto por novidades que o carro menos rodado na avaliação tenha ganho a minha preferência. Mas não é bem assim. É apenas a constatação cartesiana que – quase sempre – o último lançamento de determinado segmento agregue mais qualidades que seu antecessor. O Golf, o que mais rodei e o mais judiado em condução esportiva, me surpreendeu por fazer tanto com tão pouco. Em um “universo” de quase 500km, é interessante observar que apenas uma moto de grande cilindrada conseguiu me ultrapassar, e isso não quer dizer que eu estava explorando limites finais de motor ou suspensão, mas apenas usufruindo de um conjunto coeso, com segurança e um pouco de pimenta na condução. Sem precisar roçar os limites do perigo verdadeiro. Mas apesar disso, ele ficou como minha última opção, evocando a necessidade premente de atualização de um carro que é Best-seller para quem gosta de dirigir... era o meu também no segmento.
O Focus perdeu sua emotividade esportiva com o motor menor, já era esperado, mas continua uma ótima opção de carro de verdade, longe de pretensões aventureiras ou do universo de SUV'S e populares. Um carro sério que pode se bem conduzido, também aufere um bom prazer ao volante. Sua carroceria continua linda....O Bravo é novidade, dono de um forte coração e agradabilíssimo de conduzir, de explorar o motor liso e suave, forte e decidido, é toda a tradição italiana de produzir carros que te conectam a ele como uma pizza calabresa atrai o estômago.
São todos boas opções para dirigir, como não existe perfeição, mesmo que as avaliações ficaram longe das condições de igualdade ideais, eu diria que o carro ideal teria a estabilidade e caixa do golf, mais o motor do Bravo e a carroceria do Focus ...ou Bravo mesmo.
Como não é possível, fico com o Bravo. Para mim, uma das referências do mercado de agora em diante. Só não pode custar o mesmo que um Focus 2.0 ou I-30, pois o negócio aperta no cimo do cume, como deve ser - pois a verdadeira virtude - não imagino no meio, mas sim no topo.